terça-feira, março 14, 2006

A lambedora de tatuagens - Silvia Curiati

Ela lambeu a estrela e a lua cravadas na pele daquele homem esquisito e ganhou os sentidos. O sentido da vida e os outros 5, muito mais apurados. Entrou numa viagem que, se tivesse volta, ela negaria até o fim. Nunca mais sairia daquele mundo.
Levantou-se e sentiu sua saia subir até quase cobrir seu rosto. Ventava, era a Marilyn Monroe de vestido branco. Sorriu lânguida e contorceu o corpo como o de uma serpente enrolada em si mesma. O homem tatuado só olhava, alheio à cena como se visse um filme.
Ela subia seu tomara-que-caia enquanto caía de joelhos, graciosa, no tapete felpudo. Seus olhos viam um mundo que não estava ali, giravam no compasso de uma música sinuosa como suas curvas. Era ela e mais ninguém, se bastaria para sempre.
O namorado, enciumado, implora para que ela pare. "Saia dessa", dizia. Ela convenientemente escutava "saia desça", e ameaçava tirar a roupa enquanto repetia a frase às gargalhadas.
Ele a segurou pelos braços, bem forte, para sentir que sobre algo ainda tinha controle. Olhou-a com ternura, disse novamente que parasse e pediu um beijo. Ela afastou-se um pouco e semi-cerrou os olhos, desconfiada. Abriu a boca, deixando que ele visse sua língua. Libertou-se com um impulso e jogou-se sobre o homem esquisito, lambendo mais uma vez sua tatuagem.

Nenhum comentário: