terça-feira, março 13, 2007

Sessão da Tarde e cavalos falantes - Silvia Curiati

Incorpore um sotaque caipira forte, daquele que puxa os Rs com vontade. Agora diga em voz alta “éR, déRdi, rícher”.

Era exatamente o que eu ouvia quando o locutor, após a apresentação de um filme, concluía: “Versão brasileira, Herbert Richards”. Normalmente, estes eram os mais legais. Aqueles cuja versão brasileira era Álamo, com uma voz de mesmo timbre daquela do locutor que anunciava no SBT “Ghandiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii”, com aquele “i” grave e eterno, eram meio toscos.

Tenho um problema com alguns roteiros.

Não entendo até hoje o que leva pessoas a fazerem filmes com cavalos falando. Nada mais chato e imbecil. O cavalo era sempre lindo, a criança tinha voz de boba e a maior tensão era o fato de ele não ganhar uma corrida ou de ela não conseguir montá-lo. Quando a atração da Sessão da Tarde era um ser relinchante de rabo que conseguia formar frases melhores que as minhas, eu resolvia dar trabalho à minha mãe e aprontar alguma em casa. Porque é absolutamente inaceitável gostar de uma porcaria destas.

Meu negócio eram as aventuras, os leves suspenses, ou aquelas comédias tipo Jerry Lewis ou Day-Hudson. Coisas que não me tratassem como uma completa imbecil.

Aliás, meu negócio era mais simbólico que qualquer outra coisa. Sessão da Tarde é a representação mais pura do ócio. É o que te perguntam se você esta assistindo quando falta ao trabalho. Combina com Danette, brigadeiro, biscoitos recheados, pipoca. Também é um ícone da doença infecto-contagiosa, do trio canja-cobertor-termômetro. Me lembra imediatamente “pneumonia”, uma das três que tive.

E me lembra que há muito não invento uma boa desculpa para ver se existem novas gerações de cavalos falantes.

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